Em um desses dias cinzentos e sem graça, acordei sentindo-me completamente desconectado da alma do mundo, do meio espiritual! Meus pés pareciam estar enraizados no solo firme terreno. Uma carga pesada agia sobre meu corpo, trazendo-me um imenso desânimo. Passei o dia tentando reagir. E, com o passar das horas, fui percebendo que não era apenas uma simples falha de conexão com o mundo astral, pois havia algo me puxando para baixo, ancorando-me em pensamentos densos, esgotando minha energia de vida!
Não
tive dúvidas que o que estava acontecendo era uma espécie de ataque
externo, mas, dessa vez - ao invés de me fechar e proteger de imediato -
eu senti que deveria tentar entender o que se passava.
Minha
mente estava dispersa, tive que juntar forças para me concentrar. Sai de
casa para caminhar um pouco, sozinho! E, enquanto andava, voltando os
olhos para dentro de mim, comecei a ouvir, em minha mente, gritos de
desespero e dor! Uma angústia muito forte foi me tomando, mesmo assim
tentei não romper o vínculo com aquele sinal. E a vibração foi
aumentando de tal modo que chegou um momento em que uma tontura forte me
dominou. Tive que procurar um lugar calmo para me encostar – ja estava
longe e não conseguiria retornar para casa naquele estado.
Comecei
a sentir muita dor em meu corpo, os gritos cada vez mais altos me
traziam delírios. Parecia que eu estava gritando junto daquelas vozes.
Sentia muito frio e depois algo parecia me queimar. Pancadas, tapas em
minha cabeça e um vento cortante desagradável. Eu não conseguia sair
daquela sensação de mal-estar, me desconectar. A exaustão chegou e me
apagou! Quando nosso ser atinge o seu limite, nossos protetores nos
acolhem, até que consigamos o mínimo de força para retornar.
Pouco
depois fui acordando e percebendo que as vozes ainda estavam em minha
mente. Mas, agora eram outras! Era uma oração! Os dizeres eram muito
fortes e carregados de uma energia muito boa. Sonolento, acho que
apaguei novamente por mais alguns instantes. Mas, desta vez retornei
mais rápido. Quando acordei estava nas Colônias de Cura, num grande
salão e, em minha frente, um grupo enorme de pessoas rezando e impondo
intensamente suas energias em união, para uma mesma direção.
Nunca
havia presenciado um trabalho tão intenso! As vozes ecoavam, fazendo
vibrar as paredes, a composição daquelas pessoas gerava algo grandioso,
difícil de descrever. No centro do círculo formado por eles pude
ver, por alguns poucos instantes, imagens de um lugar escuro, sujo e
estranho, onde muitas almas rastejavam. Aquilo tudo me chocou! Eu sabia
que o objetivo que unia aquelas pessoas era algo divino, algo do bem,
porém, era uma energia forte e vibrante demais confrontando minha
natureza! Não dei conta da situação, precisei retirar-me logo do salão.
Senti novamente dor em todo meu corpo! Na verdade era a primeira
vez que sentia meu corpo físico nos solos sagrados das Colônias! Eu
suava, sentia sede, tremia!
Logo, uma moça que passava por ali me
pegou pela mão e, transmitindo muita paz, começou a me explicar: Aquele
era o grupo de resgate das almas do umbral! Eles intercediam por elas,
canalizavam suas energias e seu amor acolhedor com o intuito de
retirá-las da ilusão, do transe profundo da indiferença, para curar seus
inconscientes delirantes, seus flagelos emocionais.
Paramos nas
sombras de um pomar e ela mostrou-me mais imagens do umbral. Eu sabia
da existência dele, mas, não imagina que era tão sombrio e triste!
Desesperador, na verdade! Difícil de imaginar quais caminhos de vida
levaram aqueles pobres espíritos até lá e principalmente, como iriam
conseguir sair. Mas deu para compreender que sem ajuda, jamais sairiam!
O umbral é uma existência de energia densa localizada após as
Colônias, para onde vão todos àqueles que, enquanto encarnados,
atentaram contra sua própria vida, seja de forma direta pelo suicídio ou
indireta pelas escolhas de hábitos nocivos, depreciando a própria saúde
mental e física, se arriscando pela gula, ou por outros vícios – ou
seja, foram atentando contra a vida gradualmente, até que conseguiram
dar um fim nela.
No umbral algumas pessoas ja chegam
arrependidas, com um pouco de lucidez e, assim passam pouco tempo por
lá. Ja outras, chegam transtornadas, ainda muito ligadas aos desejos
carnais e acabam sofrendo e permanecendo por lá muito mais!
Desde
o momento que chegam lá começam a receber a ajuda das boas almas das
Colônias e de alguns seres encarnados ricos em desapego que,
amorosamente, de forma consciente ou não, canalizam a eles suas
intenções. E lá, eles passam por várias fases: Primeiro, precisam
realmente acordar, sair do transe profundo! Depois, precisam começar a
perdoar a si mesmo, precisam parar de querer sofrer para apagar os erros
do passado. Em seguida, vem à fase de começar a enxergar as réstias de
luz e a aceitar as tantas ajudas que estão chegando. Por último, é
necessário recuperar a vontade de recomeçar, de querer uma nova chance.
E durante todo esse processo, por mais que não pareça, estão sendo
amparados por muitos seres de luz.
Quando eles chegam às colônias
ainda estão muito debilitados, estão conscientes e aceitaram sua nova
realidade, mas ainda estão muito fracos, com muitas más lembranças,
traumas e dores emocionais.
Existe outro grupo que trabalha
recebendo esses flagelados do umbral nas Colônias. Eles têm a função de
digamos, ressocializar esses almas.
Senti que era o momento de
retornar à frequência mundana. Agradeci à moça pelo apoio e por mais
esse aprendizado. Ela me deu um abraço se despedindo e apontou no
horizonte para um espirito bem fraco, de áurea cinzenta, dizendo que ele
havia chegado a pouco do umbral. Fui caminhando de regresso ao Portal
das Colônias e, quando percebi, esse espirito que ela apontou estava
caminhando ao meu lado. Ele foi todo o tempo calado e bem devagar.
Reduzi meu ritmo para não ultrapassá-lo. Um pouco antes de eu passar
pelo Portal ele parou e disse:
- Obrigado por sua visita e por sua ajuda!
- Qual é seu nome? – perguntei sem entender!
- Lucas! Disse ele antes de desaparecer.
Retornei
ao meio físico! Minha mente estava leve, bem melhor, mas meu corpo
físico estava em frangalhos – tive dificuldades para caminhar até minha
casa! Não deveria, mas acabei absorvendo parte da carga negativa durante
a visita ao umbral.
No final daquele dia, já bem mais disposto,
enquanto eu me preparava para dormir uma voz conhecida sussurrou ao meu
ouvido, pedindo para eu pegar um pedaço de papel e caneta, para
psicografar. E materializou a mensagem que segue:
“Recentemente, enfrentei o inverno de minha existência! Grandes
dificuldades se apresentaram. E, enquanto eu tentava recuperar as
forças, acabei esquecendo até mesmo de quem eu era!
Não sei se
por benção ou leve retardo, mas minha capacidade de memória nunca foi um
primor. No livro da vida, enquanto a mão direita escrevia meus dias a
esquerda apagava! Um imenso vazio nos registros do passado e de
resto, em meu inconsciente, apenas resquícios insanos da lembrança de
uma réstia de luz dourada escorrendo entre as frestas de algum telhado e
do som de uma lira estridente metalizada. Apenas delírios!
Pensamentos viram pó, mas os sentimentos por eles gerados eternizam-se
em nossa alma - os bons e os maus - por dádiva perfeita da criação!
Talvez essa seja a explicação de um grande e impiedoso sentimento de
culpa ter povoado minha mente cansada, mesmo eu não conseguindo lembrar
daquilo que eu pudesse ter feito de tão errado. Meu corpo sempre suando
frio sem aparente motivo, enquanto minha mente fugidia voava entre densa
fumaça.
Lembranças não vinham, mas o sentimento era de que em
alguma curva da estrada desviei-me completamente de meu caminho! Mas,
quando? E por quê? Carma ou castigo? A insensibilidade tomou cada gota
de mim, e eu sem saber para onde fugir! E no fim do poço, nenhum rosto!
Cheguei ao auge de meu desespero!
Eu apenas rastejava. Não
sabia por que estava alí, naquele lugar tão sombrio e hostil. Mas, não
conseguia sair! Devo ter estado muitos momentos inconsciente, pois cada
vez que eu despertava estava num lugar diferente e pior.
Agora
estou bem! Ainda sinto náuseas e dores num corpo que nem existe mais.
Mas, sinto que estou melhorando momento a momento. Ainda não retomei
minhas memórias – às vezes penso que seria melhor nem recuperá-las mesmo
– mas, elas devem retornar quando chegar a hora. E, por isso lhe chamei
às Colônias, por isso lhe pedi para escrever, para me ajudar a ter a
chance de materializar meu agradecimento, minha gratidão ao Pai
misericordioso e a todos os seres que intercederam por mim, que
acreditarem em minha recuperação quando eu mesmo duvidei. E desejo
dedicar o restante de minha existência ao auxilio das almas que estão
passando pelo que eu passei, que estão sentindo o que eu senti, que
erraram como eu errei, para que se arrependam como eu me arrependi e
para que reencontrem seus caminhos, assim como estou tentando
reencontrar o meu. Agradeço ao mundo, pela nova chance que me foi
concedida.”
Lucas D.
Julius, pela inspiração de Lucas D. – uma alma resgatada das garras do umbral...